Foto de Josh Sisk
Todo e qualquer headbanger sério que esteja vivo e respirando sabe que: A) metal é a lei e B) qualquer outro gênero nem se compara, mas sempre é bacana ver alguns dados quantificáveis que comprovem isso, além de debates acalorados durante sessões de louvor ao Kreator com seus amigos. O Spotify jogou um ossinho pros cabeludos recentemente ao divulgar uma série de números que detalham exatamente com que margem o heavy metal domina as ondas do streaming. A pesquisa buscava determinar quais fãs eram mais fieis, por gênero – ou seja, que com frequência retornavam aos seus artistas favoritos. Como notado pelo Spotify, “para medir a lealdade de um gênero, dividimos o número de streams que cada artista principal tinha por número de ouvintes. Todas as tabelas foram normalizadas com o gênero de acordo com os fãs mais fieis”. Surpresa! O metal venceu. De Portugal aos EUA à (claro) Noruega, o metal permanece entre os dez primeiros – e também entre os cinco, normalmente – gêneros mais fielmente escutados em todos os países inclusos no estudo. O metal também leva a coroa da fidelidade global, deixando o pop em um distante segundo lugar, enquanto folk, country e hip-hop engolem poeira. Como comentado pelo Mashable, o Spotify calculou seus dados com base em conjuntos de bandas-chave para cada gênero, com os campeões do metal sendo Metallica, Slayer, Judas Priest, Iron Maiden, Sepultura, Pantera, Cradle of Filth e Anthrax. Não é surpreendente saber que um monte de gente está usando o Spotify para ouvir sons clássicos do Slayer e Metallica e que ouvintes de metal tem uma tendência a revisitarem seus favoritos, mas o que é meio chocante é ver como tem gente que fica meio aturdida com esse fato.
Dada a fidelidade extrema dos fãs de metal para com seu gênero e propensão a compras físicas, faz sentido que passem boa parte do tempo reouvindo músicas antigas do Iron Maiden. Como comentado pelo pessoal das gravadoras entrevistado no artigo do Mashable, estes selos de metal vendem fitas cassete e discos de vinil há anos, e camisetas de banda e patches são lugar-comum no visual, festivais de metal regularmente atraem fãs de tudo que é canto no mundo, e ainda existe um sem-fim de revistas de metal e fanzines impressos circulando em um mundo que, em grande parte, digitalizou-se. Enquanto fãs de outros gêneros são atraídos por novos artistas, no metal a coisa é uma questão de geração; novos recrutas são encorajados a apreciarem as bandas que vieram antes e construírem seu conhecimento cronologicamente enquanto se mantém informados do que está rolando. Essa espécie de largo funil musical leva diretamente a mais vendas; quando alguém compra um disco novo do Mefitic, é provável que também estejam aumentando sua coleção do Blasphemy ou finalmente pegando aquele box do Hellhammer. Metaleiros são completistas, e enquanto gênero, o metal é incrivelmente variado; existem milhares de bandas às quais alguém pode jurar lealdade, algo feito também com suas economias.
Crédito: Spotify
Esta abordagem não é exclusiva dos batedores de cabeça, mas eles definitivamente levam a coisa mais a sério que qualquer outro público. Não é tão fácil ser entusiasta do metal quanto declarar seu amor por Taylor Swift ou Makonnen, e a devoção absurda dos headbangers à sua cena é muitas vezes uma reação à pressão social. Quando o mundo todo te diz que a música que você gosta é burra, ruim ou inaudível, ou você vai ficar na sua e deixar seus gostos pra si... ou vai sair pra cima e pra baixo com camisas de banda, ir a shows de gente que pense parecido, e criar alianças sempre que possível.
Aquele mesmo artigo no Mashable deu o seu melhor para tentar explicar a ideia de que não só o metal existe depois “do auge nos anos 80 e 90”, mas mais gente do que nunca se rendeu aos seus encantos, ao que só posso responder: dãr, cara. É tentador tratar artigos como este como ruído puro e simples – algo que não afeta nossa comunidade e não tem efeito nenhum em nossa relação com o metal – mas suas implicações são graves. Em 2015, anos depois do New York Times ter começado a falar de doom metal e empresas automobilísticas promoverem shows com o Absu e Napalm Death, a grande mídia e a sociedade em geral não encaram o metal como arte séria e ainda nos deparamos com textos que apresentam o gênero com o mesmo tom condescendente de como se tivessem descoberto uma nova tribo nos confins da Amazônia. “Acredite se quiser, mas ainda existem fãs de heavy metal nos dias de hoje, praticando seus estranhos costumes e rituais longe de olhares curiosos...”
Como dito pelo Mashable enquanto se ajeita em seus jeans de velho, “o que pode surpreender para muitos ouvintes de música mainstream que trocaram Skid Row e Def Leppard há muito tempo atrás por John Legend e Taylor Swift é que o heavy metal manteve uma cena vibrante e diversa – além de muito global – graças a estes fãs dedicados”. Eu até entendo a necessidade de se escrever para um público amplo, mas presumir que as pessoas precisem ser lembradas do alcance global de um gênero cujos principais personagens vieram de locais muito distantes da fronteira dos EUA (Black Sabbath? Enslaved? Sepultura? Não? Beleza) só mostra o quão entranhada é a percepção do metal como nada mais que um flash de gente com permanentes, muita lycra e guitarras em punho.
Como revelado pelos dados do Spotify, o metal é um negócio global, e os headbangers estão por toda parte. A grande mídia e a indústria musical só se machucam ao ignorar e diminuir este rico veio de fãs internacionais e dedicados, que em sua maioria estão prontos para gastar o que puderem em merchandising, revistas e música em formato físico. O metal não precisa deles, mas enquanto os serviços de streaming continuarem rendendo e as vendas de música em formato físico continuarem caindo, talvez eles descubram que precisam de mais metal... E não faria mal tratar o gênero – e por extensão nós, fãs – com um pouquinho mais de respeito até que o derradeiro dia chegue.
Kim Kelly também defende o heavy metal no Twitter: @grimkim
Tradução: Thiago “Índio” Silva